segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Instantes da Vida. 2º capitulo

Nunca se esquece do lugar onde se nasceu. Passe o tempo que for, estejamos em qualquer lugar do mundo, continuamos a chamar este lugar de minha terra, com uma possesividade imperativa que sai do coração, com orgulho: o lugar onde nasci.


Pode ser um lugarejo, perdido no fim do mundo, sem o verde dos prados, cinza, sem mar, sem rio, sem canto de pássaros. Mas é a sua terra, o seu lugar no mundo. A mais, mais, de todos os lugares.

Minha terra era magestosa, cortada por um rio caudaloso, largo com margens coloridas, por malmequer e outras tantas flores silvestres. Na beira do seu leito, as lavadeiras lavavam as roupas das suas patroas, ensaboando-as sobre as pedras, esfregando com mãos calejadas e esfregavam, esfregavam e as mergulhavam no rio.

Levantavam as roupas,olhavam, virava e olhava e voltavam a esfregar.Esfregavam, esfregavam até não encontar nenhum sinal e sujeira.


Em seguida, para soltar o sujo persistente, teimoso,agarrado e escondido, realizavam um ritual excentrico:de cocoras, e com todas as forças dos seus cansados braços, açoitava as peças de roupas, uma a uma, sobre as negras pedras do rio cachoeira, as levantavam e as açoitavam nas pedras, vez após vez até achar que estavam impecavelmente limpas.


Enquanto elas assim trabalhavam, entoavam músicas tristes, em ritimo de ladainhas.


Perto de sí, seus filhos pequeno, ainda em tenra idade, mergulhavam nus, nas poças de água para pegar "piabas".

Quando a fome chegava, abriam um pequeno "borná" e comiam banana com farinha, corajosos, engoliam piabas vivas para aprenderem a nadar.


Se aprendiam a nadar por terem engolido piabas vivas, não sei, mas, aos três ou quatro anos já sabiam dar suas braçadas. Aos doze, atravessavam o grande rio nadando.

Após esfregar as roupas nas pedras do rio, elas eram espalhadas para "quarar" e recolhidas depois, para enxaguar e em seguida, estendidas na relva verde, brilhavam ao sol.

Enquanto as lavadeiras trabalhavam, iam cantando antigas modinhas acompanhadas, pelo sons das águas rolando no rio.

Tudo na minha terra cantava, o rio também cantava. As águas iam rolando, descendo em busca do mar: chuá...chuá, descendo, descendo, formando pequenas corredeiras sobre as pedras e assim ia em busca do mar, chuá, chuá...e as lavadeiras cantando e as roupas batidas sobre as pedras: plá,plá plá.

As lavadeiras cantavam suas modinhas tristes: eu vou pilar, eu vou pialr eu vou pilar café, pila, pila meu benzinho que papai não quer. E o rio acompanhava: chuá chuá...plá plá plá.. chuá chuá...e as crinaças caindo na água, tibuf, tibuf....rá,rá rá,óia, óia,óia peguei uma piaba! uma grande algazarra.

Nós as crianças também cantavamos, aos domingos, no programa do titio Brandão:Minha tia yolanda a me ensinava uma música para cantar na rádio. Repita, repita dizia ela,repita mais uma vez assim... comprei um lote de terreno a prestação, o moço disse que era perto da estação,andei andei a pé, o terreno era uma lagoa assim de jacaré,cheguei até o fim eu correndo atás do trem e o jacaré atrás de mim. Assim cantei na rádio Difusora de Itabuna.A cidade toda ouviu a neta de d. Maria cantando na rádio.


Se pudesse escolher o que cantar, cantaria a música de wandeléia:"Por favor pare agora, senhor juiz."..estava na moda, sabia toda e não precisava ensaiar e nem tomar cascudos quando errasse.

Valeu o esforço da minha tia, ganhei o premio:uma boneca que andava.Batizei o prêmio de Diana.Dura,sem esboçar nenhuma emoção,olhava fixo em uma única direção e lá ia andando, puxada pelo braço. Ia por onde o braço do condutor a levasse:toc,toc,toc cantavam as articulações de suas duras pernas. Não importava se não fosse uma boneca que sentasse.Ela andava. Era uma boneca grande que andava.-Quem não gostava de uma boneca grande?